Está causando muita discussão postagem reproduzida do Senado Federal sobre a Súmula 358 do STJ – “O cancelamento de pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à decisão judicial, mediante contraditório, ainda que nos próprios autos.”
Porém, ao contrário do que muitos imaginam, a declinada súmula não deve ser interpretada como se estivéssemos diante de uma uma arbitrariedade, ilegalidade, imoralidade ou injustiça. E, para isso, é necessário entendermos alguns aspectos operacionais e legais, vejamos:
O valor da pensão alimentícia deve atender a necessidade de quem recebe e ser adequado com a capacidade financeira de quem paga, sendo essa sua essência legal (veja mais).
Caso estivéssemos diante de uma regra oposta, ou seja, se ao atingir a maioridade a pensão alimentícia automaticamente deixasse de ser devida e o filho maior tivesse que pleiteá-la judicialmente, a imensa maioria dos credores sofreriam prejuízos sérios, pois, precisariam:
Porém, quem conhece o rito das ações alimentícias, sabe ser extremamente comum que a justiça demore dois anos ou mais para localizar o devedor, quando localiza. E, se localizado fosse, teríamos um processo normal, com direito a argumentações das partes, para que aí sim fosse decidido o valor da pensão, algo que, exceto a existência de alguma decisão antecipatória, poderia superar facilmente mais três anos.
Sim, não seriam raros os casos em que somente por volta dos 21 anos é que o filho passaria a ter o direito em continuar recebendo os valores da pensão.
E, como o filho viveria por anos sem o recebimento da pensão alimentícia?
Portanto, considerando as peculiaridades do judiciário brasileiro e da nossa legislação, o efeito prático de autorizar automaticamente a exoneração de alimentos aos 18 anos seria o caos, o número de pessoas prejudicadas seria infinitamente maior e, o judiciário brasileiro não estaria, como não está, operacionalmente preparado para isso, tampouco nossa legislação.
Assim, cabe ao pai pedir a exoneração após a maioridade.
E, é para evitar prejuízos aos necessitados, que há a Súmula, pois, ao contrário do que se imagina, a Lei não oferta o livre direito para que o filho maior receba alimentos por prazo indeterminado, pelo contrário, ela apenas estabelece que:
o devedor de alimentos, normalmente o pai, após a maioridade do filho, para deixar de pagar os alimentos precisará requerer o pedido judicialmente.
Desse modo, instaurado o processo legal, caberá ao filho comprovar que precisa continuar recebendo os alimentos. Isso porque, enquanto o filho é menor, o direito em receber alimentos é decorrente do chamado “poder familiar”, previsto nos artigos 1.630 e 1.634 do CC[i], sendo desejo do legislador que até a maioridade os filhos consigam usufruir do necessário para sua criação e educação, por isso, é possível dizer que o poder familiar está relacionado diretamente com o dever de sustento.
Poder Familiar = Dever de Sustento (até 18 anos)
Já, após a maioridade, incide o que chamamos de dever de solidariedade. Assim, pessoas, em decorrência fato jurídico determinado na legislação, podem requerer reciprocamente alimentos para que tenham condições de se sustentar, arts. 1.694 e 1.696 do Código Civil
Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
1o Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.
2o Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.
Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.
Dessa forma, após os 18 anos cessa-se o poder familiar, contudo, “nasce” o dever da solidariedade.
Assim, entendeu-se ser melhor não suspender automaticamente o direito ao recebimento da pensão pelo simples fato do filho ter completado 18 anos, transferindo, portanto, normalmente, ao pai o direito em requerer judicialmente a diminuição do valor ou até mesmo sua exoneração.
E, quando o pai faz uso da previsão legal, caberá ao filho demonstrar a necessidade em continuar recebendo pensão alimentícia.
Desse modo, na ação judicial será analisado realmente se o filho maior de 18 anos deve ou não continuar recebendo a pensão no mesmo valor, se o valor diminui ou se não terá mais direito algum, tudo dependerá realmente de cada caso individualizado.
Portanto, ao contrário do que se imagina
a legislação, não estimula e/ou incentiva e/ou assegura aos filhos maiores de 18 anos o direito ao recebimento da pensão alimentícias eternamente
muito pelo contrário.
Contudo, caberá ao pai (normalmente quem paga os alimentos) após a maioridade do filho discutir judicialmente os valores, sendo vetado apenas que deixe de pagar automaticamente a pensão, necessitado para isso a autorização judicial.
Portanto,
ao contrário do que várias pessoas interpretam, não há na legislação nenhum incentivo à ociosidade dos filhos maiores de idade e o direito em continuar recebendo os alimentos eternamente.
O que há na lei é apenas uma regra determinando que após a maioridade do filho, como ocorre em qualquer outra fase, quando o devedor quiser discutir valores da pensão, que faça de forma correta e não arbitraria.
Ademais, pela lei atual, o que seja deseja é proteger realmente os filhos esforçados, para que possam ter condições financeiras e educacionais maiores do que seus pais, até porque, considerando a legislação e a própria vida, o filho que recebe pensão hoje poderá no futuro ter que pagar pensão ao próprio pai, portanto, quanto mais qualificado o filho maiores serão as chances de que prestará um auxílio melhor ao seu pai, por exemplo.
Conclui-se, portanto, que, ainda que possa parecer injusto e ilegal pagar pensão após ao filho maioridade, ao aprofundarmos a essência da lei e dos seus reais anseios, é perceptível que, na grande maioria das vezes, somente o filho merecedor e realmente esforçado é quem continuará recebendo a pensão alimentícia após 18 anos, nos demais casos, ou o judiciário reduzirá significativamente a pensão ou exonerará o direito em recebe-la, afinal de contas –
pensão de alimentos, em que pese ser um direito, não é muletas
para que o filho viva sendo sustentado pelo pai eternamente. Mas, para que isso ocorra, é dever do pai procurar o judiciário para resguardo de seus direitos.
Obs: foi utilizado a figura do pai, mas o caso aplica para os casos em que a mãe é a devedora de alimentos.
[i] Art. 1630. Os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores.
Art. 1634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:
I – dirigir-lhes a criação e a educação;
II – exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584;
III – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;
IV – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior;
V – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município;
VI – nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;
VII – representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;
VIII – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;
IX – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição. (NR) (Artigo com redação determinada na Lei nº 13.058, de 22.12.2014, DOU 23.12.2014)
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